sexta-feira, 15 de junho de 2007

Solidão das multidões

As cidades são espaços privilegiados para grandes multidões, seja no estádio de futebol, num concerto, num centro comercial, numa igreja, na rua, nos transportes.

No entanto, cada vez mais os suburbanos sofrem de um mal que vai matando aos poucos a capacidade de cada um se relacionar com os outros: a imensa solidão que a maioria sente nesses grandes espaços públicos.

A solidão urbana é fria, indiferente a sexo, raça, extracto social ou credo religioso. Esta solidão é alimentada por um ritmo de vida alucinante, em que cada um vive para cumprir um horário feito para super-homens ou para dias de 48h. É neste ambiente de loucura que ainda se tenta encontrar um amigo ou amiga, uma ou mais almas com quem se pode compartilhar momentos de prazer e descontracção.

É também neste ambiente que as relações intimas tentam sobreviver quando ele trabalha das 9 às 21 e ainda é roubado pelos colegas para ir para aquele jantar de negócios e ela trabalha das 9 às 21, mas depois vai ao ginásio para combater o stress, ou fica com aquela enxaqueca terrível depois de um dia terrível. Quando finalmente podem estar juntos, estão demasiado cansados para sentir o prazer de estar um com o outro.

Se a isto juntarem filhos ou outras ocupações tão tipicamente urbanas, o que resta? Apenas a solidão de uma cama fria ou de uma sala vazia, uma falta de intimidade com alguém que compense todos aqueles momentos mais desagradáveis em mais um dia no inferno da Suburbia.

Esta solidão das multidões é talvez o mais ignorado dos sentimentos da Suburbia, talvez porque toda a gente tenha vergonha de assumir que se sente sozinho no meio de uma multidão. Mas todos os dias, milhares e milhares de pessoas deslocam-se sozinhas na cidade, sozinhas com os seus pensamentos, medos, alegrias, ambições. Que bom seria se o pudessem partilhar com alguém! Quantas vezes não sentiram necessidade de contar a alguém algum evento e não tinham ninguém que o pudesse ouvir? Ao mesmo tempo quantos já não passaram por aqueles momentos confrangedores de alguém que não se conhece mete conversa só por que lhe apeteceu e ficamos a pensar: "Este não bate bem dos pirulitos..."

Mas agora chegou a maravilha da tecnologia que permite ultrapassar isso tudo: está sozinho e quer falar com alguém? Não incomode o seu vizinho, telefone para o seu amigo ou amiga que está a 200km de distância, para lhe falar sobre aquele assunto que no momento achou o mais importante da sua vida. Só que esta tecnologia na prática aumenta ainda mais a solidão, senão vejamos: quem não passou já pelo constrangimento de estar num almoço de amigos e 75% dos elementos na mesa estão ao telemóvel com alguém?

É por crescer este tipo de solidão que cada dia mais a sociedade, e em particular as moles urbanas estão cada vez mais descaracterizadas, tristes, amorfas, sem vida, pois está a perder-se a capacidade de comunicar com os outros de forma espontânea. Para compensar isso, criam-se as comunidades virtuais e outros estratagemas tecnológicos para reinventar o puro prazer de estar com os outros.

Não vou sugerir que agora desate a falar com aquele grupinho que vai de Metro consigo ou meta conversa com o vizinho da fila de trânsito, mas redescubra o prazer de conversar, estar com a família, os amigos e deixe lá o telemóvel em silêncio por uns minutos. Vai ver que o telemóvel não se vai sentir só (por enquanto!).

E sorria, sorria com o verdadeiro prazer de viver. Vai ver que não dói e no fim do dia sentir-se-á menos só.

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