quarta-feira, 30 de abril de 2008

Elogio do Amor (Miguel Esteves Cardoso)

Eu sei que este texto não cola muito bem com o contexto do resto do blogue, mas é interessante, pois demonstra como a sociedade mais urbana, mais calculista, começa a perder determinados valores que antes eram os pilares de uma vida. Pessoalmente, apesar de considerar o Miguel Esteves Cardoso uma mente louca, tem rasgos de genialidade e sobretudo retrata bem o ser e estar no Portugal Urbano dos dias de hoje, ou seja, a Suburbia.

Este texto saiu no Expresso em 2005, não consegui precisar a data nem obter a fonte original, mas podem encontra-lo aqui, aqui, ou aqui, por exemplo.

Quero fazer O elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de
verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar
sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática.
Porque dá jeito. Porque são colegas e estão Ali mesmo ao lado.
Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é
mais barato, por causa DA Casa. Por causa DA cama. Por causa das cuecas e
das calças e das contas DA lavandaria.

Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de
antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em 'diálogo'. O amor
passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.
Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa
variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser
desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O
resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam
'praticamente' apaixonadas.

Eu quero fazer O elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do
amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas,
farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi
namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como OS de hoje.
Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia,
são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, Malta do 'tá tudo bem,
tudo bem', tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides,
borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já
ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, O
desequilíbrio, O medo, O custo, O amor, a doença que é como um cancro a
comer-nos O coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?

O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não
é para ser O alívio, O repouso, O intervalo, a pancadinha nas costas, a
pausa que refresca, O pronto-socorro DA tortuosa estrada DA vida, O nosso
'dá lá um jeitinho sentimental'. Odeio esta mania contemporânea por sopas e
descanso. Odeio OS novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se
vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a
loja. Foi trespassada ao pessoal DA pantufa e DA serenidade. Amor é amor. É
essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é
para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode.
Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para
nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de
inferno aberto.

O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes Mata O amor. A
'vidinha' é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um
fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem
tanto a ver Com a vida de cada um como O clima. O amor não se percebe. Não
dá para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa
alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe,
não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que
a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e
minta e sonhe O que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade
pode matar, O amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num
momento, num olhar, O coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por
muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração
guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida,
quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso
amor, o amor que se lhe tem.

Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se
ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver
sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode
ceder. Não se pode resistir.

A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não.
Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.

Miguel Esteves Cardoso, in Expresso



segunda-feira, 21 de abril de 2008

Mestrado em Gestão de Campos de Golfe

Aí está o futuro da Educação em Portugal, ou devemos dizer o futuro da education in West Coast of Europe, made by Tugas, retirado do blogue Abnoxio


Acho que nem merece muitos comentários, apesar da profissão ser tão nobre quanto qualquer outra! Apenas demonstra o tipo de subserviência que cada vez mais temos perante tudo o que é importado, sejam produtos, sejam ideias, sejam pessoas.

Mas esta Suburbia gerida por mestres é com certeza mais bem tratada do que aquela em que vivo actualmente!

sábado, 19 de abril de 2008

Cuidado, esta gente vota (ou a estupidez que nem sempre tem limites)

Isto é obviamente uma caricatura do que é o ser humano, mas não deixa de nos fazer pensar o nível de estupidez que há por essa Suburbia. Poderiam até chamar-se "Episódios da Vida Moderna" ou mas o título original é "Cuidado, esta gente vota!". No entanto, desconfio que haja muitos de nós que já ouviram, viram ou passaram por situações bizarramente semelhantes:

Um amigo meu comprou um frigorífico novo e para se livrar do velho, colocou-o em frente do prédio, no passeio, com o aviso:
"Grátis e a funcionar. Se quiser, pode levar".
O frigorífico ficou três dias no passeio sem receber um olhar dos passantes. Ele chegou à conclusão que as pessoas não acreditavam na oferta. Parecia bom de mais para ser verdade e mudou o aviso: "Frigorífico à venda por 50,00 €."
No dia seguinte, tinha sido roubado!

Ao visitar uma casa para alugar, o meu irmão perguntou à agente imobiliária para que lado era o Norte, porque não queria que o sol o acordasse todas as manhãs.. A agente perguntou: "O sol nasce no Norte?" Quando o meu irmão lhe explicou que o sol nasce a Nascente (aliás, daí o nome e que há muito tempoque isso acontece!) ela disse: "Eu não estou actualizada a respeito destes
assuntos".

Trabalhei uns anos num centro de atendimento a clientes em Ponta Delgada - Açores. Um dia, recebi um telefonema de um sujeito que perguntou em que horário o centro de atendimento estava aberto.
Eu respondi: "O número que o senhor discou está disponível 24 horas por dia, 7 dias por semana."
Ele então perguntou: "Pelo horário de Lisboa ou pelo horário de Ponta Delgada?"
Para acabar logo com o assunto, respondi: "Horário do Brasil."

Um colega e eu estávamos a almoçar no self-service da empresa, quando ouvimos uma das assistentes administrativas falar a respeito das queimaduras de sol que ela tinha, por ter ido de carro para o litoral. Estava num descapotável, por isso, "não pensou que ficasse queimada, pois o carro estava em movimento."

A minha cunhada tem uma ferramenta salva-vidas no carro, para cortar o cinto de segurança, se ela ficar presa nele. Ela guarda a ferramenta no porta-bagagens!

Uns amigos e eu fomos comprar cerveja para uma festa e notámos que as grades tinham desconto de 10%. Como era uma festa grande, comprámos 2 grades. O caixa multiplicou 10% por 2 e fez-nos um desconto de 20%.

Saí com um amigo e vimos uma mulher com uma argola no nariz, ligada a um brinco, por meio de uma corrente. O meu amigo disse: "Será que a corrente não dá um puxão cada vez que ela vira a cabeça?" Expliquei-lhe que o nariz e a orelha de uma pessoa permanecem à mesma distância, independentemente da pessoa virar a cabeça ou não.

Ao chegar de avião, as minhas malas nunca mais apareciam na área de recolha da bagagem. Fui então ao sector da bagagem extraviada e disse à mulher que as minhas malas não tinham aparecido. Ela sorriu e disse-me para não me preocupar, porque ela era uma profissional treinada e eu estava em boas mãos."Agora diga-me, perguntou ela... o seu avião já chegou?"


À espera de ser atendido numa pizzaria observei um homem a pedir uma pizza para levar. Ele estava sozinho e o empregado perguntou se ele preferia que a pizza fosse cortada em 4 pedaços ou em 6. Ele pensou algum tempo, antes de responder: "Corte em 4 pedaços; acho que não estou com fome suficiente para comer 6 pedaços"


Agora já sabem QUEM elege os políticos!... Apesar da política estar totalmente desacreditada, isso deriva de uma sociedade completamente amorfa, em que apenas a boçalidade e estupidez são notabilizadas. Viva a sua vida de forma mais inteligente e participativa!

sábado, 12 de abril de 2008

"Poema Enjoadinho" - Vinicius de Moraes

"Filhos... Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaça
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:

Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!"

De Vinicius de Moraes


Como são belas as palavras simples, que qualquer um de nós poderia ter dito ou pensado, mas que apenas houve um iluminado que as soube pôr num simples poema. Vinicius de Moraes, como poeta brasileiro e urbano que era, soube bem retratar o que são as dúvidas e anseios de quem quer ter filhos, mas sempre tem dúvidas sobre esta decisão.

Quantos são os pais ou futuros pais que não sentiram já dentro de si esta dúvida, e depois dos filhos nascidos e de os terem feito passar por tormentos e torturas, continuam a dizer "Que coisa louca, que coisa linda que os filhos são!"?

No ambiente suburbano talvez isso seja cada vez mais verdade, pois os perigos e desafios que são colocados às gerações mais novas, fazem-nos pensar muito sobre que tipo de educação e que valores devemos incutir nos nossos filhos, para pelo menos tentar que eles sobrevivam quase incólumes à selva urbana. No entanto, eles acabam por ser sempre uma das razões porque ainda cremos que a Suburbia pode vir a ser melhor, pela sua inocência, pela sua visão quase sempre diferente do mundo. Eu com o meu modestíssimo contributo, tentarei incutir valores de respeito pelos outros, mas sabendo também exigir os seus direitos, ou seja, que sejam cidadãos da Suburbia que contribuam para ela ser um pouco melhor!

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Wonderful Tonight



It's late in the evening; she's wondering what clothes to wear.
She puts on her make-up and brushes her long blonde hair.
And then she asks me, "Do I look all right?"
And I say, "Yes, you look wonderful tonight."

We go to a party and everyone turns to see
This beautiful lady that's walking around with me.
And then she asks me, "Do you feel all right?"
And I say, "Yes, I feel wonderful tonight."

I feel wonderful because I see
The love light in your eyes.
And the wonder of it all
Is that you just don't realize how much I love you.

It's time to go home now and I've got an aching head,
So I give her the car keys and she helps me to bed.
And then I tell her, as I turn out the light,
I say, "My darling, you were wonderful tonight.
Oh my darling, you were wonderful tonight."

"Wonderful Tonight", by Eric Clapton

Já ouvi opiniões sobre a tristeza desta letra, de como seria a prova de uma relação destroçada, mas não consigo deixar de me emocionar com esta canção, pois apesar de muito simples, representa algo que cada dia se esquece mais na Suburbia: sem o amor/amizade dos que nos são mais próximos, nada faz sentido.
Talvez por isso cada vez mais encontramos pessoas tristes, sem rumo, até ressabiadas com a vida, porque perderam um amor ou nunca foram amadas. Este amor não será apenas paixão, mas também amizade, querer bem a quem está próximo e que contribui todos os dias para que a vida que levamos seja um pouco menos penosa.

Nos dias loucos das sociedades actuais, o valor que é dado à individualidade é muito superior ao que é dado ao sentimento de bem querer pelos outros. Talvez por isso cada vez mais sejam incompreendidos os sentimentos de amizade desprendida, de vontade de ajudar o outro, de ter prazer na companhia de outro, sem que isso queira dizer que se quer tirar algum proveito adicional que não seja o puro prazer de ter essas pessoas ali ao nosso lado, nem que seja a fazer a coisa mais idiota que possamos pensar.

A felicidade também passa por esses momentos banais, mas que devemos relembrá-los com carinho, pois caso contrário, a vida é um conjunto enorme de futilidades, e apesar de querer acreditar na vida para além de nós, são estas memórias que posso e quero guardar.

Quando leio esta letra e ouço esta música, ela aplica-se muito bem a mim e ao meu amor, que sempre me deixou orgulhoso de ter o amor dela e de a amar. Sem ela a minha vida não faria qualquer sentido, pois é o seu amor que me mantém a tona de água, aguentando o inferno da Suburbia nas suas vertentes mais escuras e assustadoras.

Porém a vida é feita da interacção com mais do que apenas 2 pessoas, e o meu sonho é que as pessoas que me rodeiam e que sempre tento ver o seu lado melhor, um dia possam retribuir com a sua amizade desprendida, e formar um grupo de pessoas que contribuam para uma Suburbia melhor, sejam eles família, amigos, colegas ou até apenas conhecidos.

Sou ingenuamente crente na ideia que a bondade produz bondade, a amizade retribui-se com amizade, e apesar de por vezes não o conseguir demonstrar, todos os que me rodeiam são importantes para aprender a viver uma vida melhor, a ser melhor como pessoa.

Isto parecem reflexões meramente egoístas, mas acredito que quem me conhece, se as ler, compreenderá o alcance do voo do meu pensamento.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

A Maior Empresa do Mundo

"Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,
mas não esqueço que a minha vida é a maior empresa do mundo.
E posso evitar que ela vá à falência.

Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os
desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar se ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de econtrar um oásis
no recôndito da sua alma.

É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um "não".
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo..."

Fernando Pessoa

A Suburbia trata-nos por vezes de forma tão louca e fria que nos faz esquecer o essencial. Este poema de Fernando Pessoa faz pensar naquilo que é essencial, a força de viver, a vontade de sobreviver, mesmo num ambiente cheio de dificuldades, que muitas vezes não sabemos como ultrapassar. O objectivo final de todos é atingir a felicidade, mesmo que a espaços e por vezes salpicada de muitas dificuldades.

Este post é dedicado a todos os que acreditam que o seu espírito positivo pode ajudar a mudar a vida dos que os rodeiam. São esses espíritos que fazem a Suburbia um lugar menos difícil de viver, e pessoalmente ainda me fazem acreditar na beleza e riqueza do ser humano, por vezes tão espezinhada na sociedade em que vivemos.

Aos que tenho tido o prazer de conhecer pessoalmente, o meu reconhecido obrigado. Aos restantes, não percam a esperança de mudar o Mundo para melhor.

Se cada um trabalhar afincadamente para a maior empresa do mundo, talvez um dia, haja uma "fusão amigável" e consigamos evoluir para um ser superior, mais próximo do que convencionámos chamar Deus. Que esse seja o nosso legado para os futuros Suburbanos!