terça-feira, 31 de outubro de 2006

Discriminações

O tema dá para encher dezenas de blogs, de posts, e nunca tudo será dito sobre o assunto. Conforme a sociedade portuguesa vai evoluindo e assimilando cada vez mais culturas e hábitos diferentes, mas de forma quase forçada e não natural, vão surgindo cada vez mais anti-corpos que derivam sobretudo do desconhecimento, da ignorância e por vezes o medo de conhecer formas diferentes de viver a vida!

Quando falo de discriminação, falo de vários tipos de discriminação: sexual, racial, social, intelectual e até geracional. Cada um destes tipos de discriminação germina em comunidades que estão perante pressões que as leva a reagir de forma adversa à mudança. Lanço apenas 2 exemplos que me estão próximos, e que espero que sirvam para reflexão de quem lê esta prosa, de forma a tentar inverter um pouco os seus comportamentos e contribuir para melhorar um pouco este Mundo cada dia mais cão.

Desde o início dos anos 80 do século passado (caramba, parece que foi há muitos anos), que se tem vindo a acentuar o crescimento de bairros nas periferias das grandes cidades, onde vivem milhares de emigrantes dos PALOP, africanos, brasileiros, de Leste, etc. Em primeiro lugar, por razões que se prendem com o apoio que existe dentro de cada uma das comunidades, os diversos grupos étnicos ou da mesma nacionalidade tendem a juntar-se num mesmo ambiente, o que considero até natural numa fase inicial da chegada a um novo país.
No entanto, deveriam ser criadas condições sociais para que esse conforto inicial dentro da comunidade se transpusesse para a comunidade envolvente, permitindo assim as pessoas crescerem e sentirem que Portugal é também a sua casa! Só assim será possível acabar com os guetos que hoje proliferam pela periferia das grandes cidades.

É bonito falar desta forma e será até politicamente correcto, mas para que isto seja uma realidade, terá que se pensar em formas de ultrapassar as barreiras existentes entre quem cá está e quem chega, formas de dar a conhecer a cultura, a forma de estar de cada comunidade, e assim contribuir para um melhor entendimento entre todos. A realidade actual está muito distante deste mundo idílico. A realidade retratada na comunicação social e que eu constato na minha realidade do dia-a-dia é que a pequena criminalidade é praticada primordialmente por individuos de raça negra (independentemente de serem portugueses nados e criados ou não), cigana e agora até por individuos dos países de Leste. Ou seja, se fossemos olhar apenas a esta visão tacanha da realidade, poder-se-ia concluir que acabando com a imigração, acabava-se com a insegurança!
Por cada um destes marginais, quanta gente mais que vive em condições deploráveis, explorados por patrões e por máfias sem escrúpulos, e que apenas querem ganhar algum dinheiro para poderem dar uma vida um pouco melhor às famílias que ficaram para trás nos seus países de origem. O que me revolta neste tipo de discriminação é a arrepiante falta de memória ou então pior ainda, a vontade de vingança mesquinha, do português médio.

Parece que hoje todos se esqueceram que a grande maioria dos habitantes das grandes cidades não nasceram lá, e que no caso de Lisboa por exemplo, migraram do interior à procura de uma vida melhor nas décadas de 1950/1960. Os que não vieram para as cidades, tentaram a sua sorte na emigração para a Europa, América e muitos deles sofreram e ainda sofrem humilhações e discriminação que deveria fazer com que a sociedade portuguesa aprendesse a não repetir estes erros com os que aterram nos nossos aeroportos e entram pelas nossas fronteiras.

Caramba, que um inglês, um francês ou um alemão não compreenda as dificuldades de integração de alguém que chega vindo de uma sociedade mais pobre, mais inculta, menos desenvolvida, eu até posso entender (não quer dizer que aceite, mas enfim...), pois não tem uma vivência na sua história recente de migrações e de procura de um futuro melhor.

Agora os portugueses, precisamente devido à história recente, em que tem um passado de emigração, de mistura com diversas raças e culturas, deveriam ser os primeiros a pelo menos receber a diversidade com uma maior abertura. Porém, a cada dia/ano que passa, cada vez há mais incompreensão e medo que derivam de uma ignorância profunda sobre quem chega ao nosso País.

Quando um estrangeiro que não conhece Portugal, me pede para caracterizar o perfil do português típico, eu diria que é uma pessoa alegre, simpática, acolhedora, amiga do seu amigo........ epá... Será?!?!? Hoje em dia, é cada vez menos assim, vivemos numa sociedade cada vez mais competitiva, em que o individualismo é a religião vigente, e em que aprendemos a ter medo e a fechar as portas a tudo o que é diferente! Onde está o português bonacheirão que convida os amigos para uma patuscada na sua casa, para tomar uns copos, e conviver com os amigos e com os conhecidos? Na cidade??? Ajuntamentos de mais de 3 pessoas já quase se consideram subversivos!

Mas também quem chega a Portugal deve fazer um esforço para conhecer os hábitos de quem cá está, de se integrar numa nova realidade, pois de outra forma ele próprio acaba por discriminar todos os outros que o rodeiam. Deveria haver incentivos à execução de trabalhos comunitários que dessem as conhecer as diversas comunidades e tentar através desse conhecimento, quebrar o ciclo vicioso de afastamento e de isolamento de cada uma delas. Mas para isso, terá que haver um esforço de todos para eliminar o que envenena e apodrece qualquer tentativa: o medo.
Enquanto não houver uma política séria para identificar e punir severamente a marginalidade dentro de cada comunidade, haverá sempre desconfiança, que leva ao medo, e que leva ao afastamento, à xenofobia e a mais marginalidade. De nada serve desmantelar os guetos para distribuir as pessoas por outros guetos, pois isso é mesmo que estar a tratar o cancro com células cancerígenas!
Por esse País fora há muita gente séria, honesta, trabalhadora, amiga de seu amigo, que não deve ser estigmatizada por que é negro, amarelo, brasileiro ou moldavo! São pessoas como eu e você, que tem anseios, que desejam uma vida melhor, e que querem ser felizes até onde seja humanamente possível! Antes de pensar "Estes tipos deviam voltar era para a terra deles", pense que um dia poderá ser a sua vez de estar na posição deles!

Este tipo de discriminação conduz a outro tipo de discriminação, a discriminação no trabalho. Nas sociedades modernas, há cada vez mais a noção que o trabalhador deve ser um super-homem ou super-mulher que tudo faz, bem feito, com base na experiência adquirida e com uma rapidez e eficiência a toda a prova.
Como a ciência ainda não atingiu esse estágio de desenvolvimento, posso dizer com razoável certeza que:
- ninguém nasce ensinado;
- ninguém trabalha sozinho ou apenas para si, senão é hobby e não trabalho;
- ainda é humano errar;
- a vida de um ser humano é feita de um acumular de experiências;
- o dia tem apenas 24 horas

Tendo por base estas permissas, penso que é razoavel concluir que é irrealista o que se pede de quem trabalha. Pede-se a um novato no primeiro emprego que tenha experiência, que saiba produzir no dia seguinte a ter começado a trabalhar, exige-se a um funcionário com 30 anos, que sempre cumpriu com o seu trabalho, que o abandone porque já está velho (e experiente). Isto quase raia o surreal, e com o passar dos tempos estamos perante uma bomba relógio que poderá trazer consequências devastadoras para as sociedades ocidentais, ao ponto de as desestruturar por completo. O único valor que subsiste é o "Salve-se quem puder" em que se espezinha tudo e todos para cumprir um objectivo.

Qualquer empresa vive das pessoas que a compõem e muitas vezes essas pessoas acabam por ser moldadas à imagem da sua empresa, quer no bom, quer no mau sentido. Porque é que isso não é reconhecido? Qualquer pessoa no activo passa quase 1/3 da sua vida a trabalhar, acabando por ser essa a actividade mais importante da sua vida a seguir a dormir!! É bom que pelo menos sejamos recompensados pelo esforço e que sejamos minimamente felizes durante esse período!

Mas para que isso aconteça, há que ser realista, estar numa envolvente em que a humanidade seja um factor crucial para a prossecução de um determinado objectivo. O espírito de equipa deve ser privilegiado, mas devem ser respeitadas as diferenças de cada um e deve haver abertura de todos para receber uma crítica construtiva, que conduza a uma melhoria de todo o grupo e de cada um!

No entanto, a visão actual que predomina é a de matilha, e não de equipa. Quem pertence à matilha, tem direito a comer. Os outros são apenas presas potenciais ou apenas vítimas por serem diferentes e não respeitarem o código da matilha. Por que é que alguém é preterido, só porque não vai todas as sextas-feiras à noite para uma farra qualquer com os restantes? Por que é que alguém é preterido por que é mulher, por que é mãe, por que é estudante, por que é avô, por que fala esquisito ou se ri muito? Em que é que estes factores contribuem para a sua produtividade e para o valor que tem para a empresa? É mais importante para a empresa o que entra às 9:00 e sai às 18:00, ou por exemplo o estudante que entra às 10:00 e sai às 16:00 e que consegue durante esse período produzir mais do que o outro que cumpriu o horário à risca? Ou que a mãe que saiu às 15h00 para amamentar o seu filho, mas que no período de trabalho conseguiu fechar aquele contrato de 100.000 euros?

Como já devem ter percebido sou a favor do conceito da meritocracia versus a uniformidade de tratamento, mas desde que aplicada justamente e não da forma enviezada como normalmente acontece nas empresas portuguesas, onde prevalece o amiguismo como critério principal, por oposição ao real mérito. Mas sobretudo, sou contra o preconceito e contra tudo o que conduza a que a relação de trabalho seja acima de tudo um método de tortura e não uma actividade sadia, necessária, e enriquecedora quer do ponto de vista financeiro, mas sobretudo como experiência de vida.

Discriminação é a negação da diferença, logo uma forma de negação da própria vida!
Aprenda a conhecer, antes de optar por um preconceito!

Pense nisso!! Por uma Sociedade melhor, que gere um pouco mais de Felicidade.

segunda-feira, 30 de outubro de 2006

O Culto da Imagem

Nas sociedades modernas, e em particular, nos meios urbanos, cada dia dá-se mais valor à imagem que cada um tenta impor aos outros. O culto da imagem é levado a um ponto em que se confunde o ser com o parecer, com a vontade de parecer algo que não é e que talvez um dia venha a ser!

No fundo, culto da imagem é quase sempre (quase!!) sinónimo de mentira, de embuste, de demonstração de um Eu que corresponde aquilo que se pensa que os outros querem que se pense de si próprio! Esta formulação é complicada, mas também o culto da imagem o é, como o são todas as mentiras que se querem tornar verdades.

Por que é que as pessoas querem parecer aquilo que não são, por que é que querem começar a enganar os outros começando pelo invólucro exterior? A verdade do ser humano está naquilo que se vê mas sobretudo naquilo que não se vê, que apenas se pressente, ou que se sente. Porém, nos dias de hoje, sentimento, verdade, honestidade são valores antiquados, fora de moda e que não se conjugam com o culto da imagem.

O culto da imagem começa por coisas tão simples, tais como a "obrigatoriedade" de um funcionário bancário andar de fato e gravata. Porquê?? Aquele invólucro torna-o mais honesto? Vai impedi-lo de enganar um cliente ou dar um desfalque no banco? Por outro lado, já viram um maltrapilho dar um desfalque? Então a imagem do fato e gravata será também um sinónimo de desonestidade? Ninguém usa esta lógica!

Mas convencionou-se esta imagem, em que o homem de negócios deve ser formal, ter uma imagem limpa e quase uniformizada. Mas por debaixo dessa imagem, escondem-se muitos homens, muitas maneiras de pensar, de viver a vida, de conviver em sociedade, muitos segredos, muitas mentiras e muitas verdades. Até porque cada um pensa por si próprio, logo será pelo menos marginalmente diferente do outro!

No caso das mulheres não há uniformidade no vestir, mas há na actuação: a grande maioria vive em diversos graus do culto da imagem, mas raramente está satisfeita com a imagem que transmite. Não pretendo nem de perto ser um crítico ou fazer uma análise psicanalítica do culto da imagem nas mulheres, apenas constatar que é um pouco diferente do dos homens e talvez mais acentuado. No entanto, nas sociedades modernas ocidentais, essa diferença é cada dia menor, e por isso se sente cada dia mais que se vive numa sociedade de mentiras.

São os ricos a parecerem mais ricos, os pobres a fingir que são ricos, os belos a mostrarem que são belos por fora e ocos por dentro, os feios a tentarem desesperadamente parecerem belos por fora, porque por dentro ninguém quer saber como são!

Muitas pessoas dizem, e incluo-me neste grupo, que "a primeira impressão sobre alguém é a que fica". Mas o interessante está em conhecermos alguém muito para além da sua imagem, desmascarar essa cortina de ilusões que tolda a visão de cada um sobre o outro. Se cada um valesse apenas pela sua imagem, teríamos um mundo quase monocromático, pois a tendência será para a uniformização dos padrões de beleza, de moda e comportamento social. Só o que está dentro dessa máquina fabulosa a que chamamos corpo humano é que trará a diferenciação, pela experiência e vivência de cada um.

Não gosto de julgar pelas aparências, mas todos temos aqueles estereótipos que não conseguimos suportar, seja pela sua intrínseca idiotice, seja pela sua inata propensão para a asneira, seja pela força bruta que emana das suas acções e que afasta quem quer que chegue perto, quer até pela santíssima e benta inocência, que ninguém acredita que possa ser verdadeira!

É do mais puro senso comum que devemos sempre defender a nossa privacidade, e para isso usamos algumas tácticas usadas no culto da imagem, mas que devem servir sobretudo para nos defendermos de quem quer se intrometer, de quem quer apenas vasculhar e chafurdar e transformar por vezes a felicidade num lodaçal imundo de meias palavras, inuendos e mal-entendidos.

Se querem um Mundo Melhor, não se façam à imagem de alguém, mostrem o que são, quem são, como são! Vão ser muito mais felizes no final do processo, quando fizerem uma introspecção sobre o valor da vossa imagem e do que ela vale para os que vos rodeiam.

No entanto, para certas pessoas, o culto da imagem é totalmente inútil, pois não conseguem sequer ver o que vêm no espelho. É uma doença bizarra, mas que acaba por ser um sinal do mundo louco em que vivemos: prosopagnosia ou "face blindness". O artigo é da WIRED.com, mas revela um universo que tenho dificuldade em assimilar, em que o doente vê as pessoas, mas não consegue identificar as feições, nem mesmo as suas próprias quando se vê ao espelho. É um mundo de imagens e de pessoas sem faces. Para estas pessoas, uma conversa deve mesmo valer mais do que mil imagens!!

Pensem nisso!!

domingo, 22 de outubro de 2006

Abertura da Vista do Subúrbio

Sejam bem-vindos à tentativa número 2 de colocar algumas reflexões pessoais sobre o Mundo em que vivemos.
Não quero ser pretensioso e dizer que este vai ser o melhor blog da Internet, nem nada que se pareça! Apenas quero, de uma forma simples e honesta, dar a conhecer mais uma visão do Mundo, que com certeza será igual e ao mesmo tempo diferente de todas as outras (ou não fôssemos humanos).
O meu mundo está na fronteira entre o socialmente correcto e socialmente marginal, pois todos os dias tenho que conviver com o medo e ao mesmo tempo com a indiferença e a monotonia. Tudo isto porque vivo num local que é quase uma aldeia, que sempre conheci desde que nasci, e que agora vive lado a lado com um dos piores bairros da cintura de Lisboa, devido à sua marginalidade e discriminação.

Bem-vindos ao meu mundo!